9 de mai. de 2009

O impossível acontece logo ali


Poeta irreverente, músico tenaz, Obdias Araújo constrói há quatro anos, e a duras penas, o sonho de ensinar música para crianças e adolescentes da periferia de Santana, segundo maior município do Amapá. Em conversa informal pelo msn, transformada em entrevista com a devida autorização, ele expressa seus sentimentos, angústias, expõe a gratidão pelo apoio recebido até hoje e as dificuldades para manter o projeto Coração Musical. O apelo de um homem que acredita que a arte transforma vidas.

Márcia - O que é o projeto?

Obdias – O Projeto Coração Musical foi pensado lá na vila do mesmo nome (Vila do Coração), onde moro.

Marcia – Começou em que condições?

Obdias - Voltado para o ensino da teoria musical, utilizando a flauta doce como material de apoio. Começou lá embaixo de uma mangueira, três meninos e uma flauta-doce. O resumo da ópera é que saiu de três para seis, oito e mais.

Marcia – Como foi parar na Promotoria da Infância e Juventude de Santana?

Obdias - Certo dia fui participar de um culto ecumênico no Ministério Público, a convite do Dr. Iacy Pelaes, na época Vice-Presidente da Assembléia de Deus no Amapá. Lá, conheci o Dr. Paulo Celso Ramos e o Dr. Roberto Álvares, que me convidaram para vir para a Promotoria da Infância e Juventude de Santana, para uma experiência de 90 dias. Estou lá há quatro anos.

Marcia – Quantos jovens tem no projeto atualmente?

Obdias - Cerca de 50 meninos. E busco parcerias. Quatro anos depois, acho que está chegando a hora de ir mais longe. Creio que meu trabalho na Infância e Juventude de Santana está findando. Eu gostaria de atingir as periferias de Macapá. Continuar trabalhando como faço em casa, mas com alguém, alguma entidade me dando o bendito suporte financeiro.

Marcia – Essa é a maior dificuldade?

Obdias - É este o meu maior problema: O suporte financeiro. Estou precisando agora de uma Flauta Baixo que custa R$ 1.400,00. Alguém tem que me ajudar. Corri um pires e em três meses consegui R$ 450,00. Comprei flauta Tenor (R$ 280,00) e Contralto (R$ 150,00).

Marcia – Por que o trabalho na Promotoria está no fim?

Obdias - A turma está se profissionalizando, e já não bastam as flautinhas de vinte e cinco reais. Na realidade, meu acordo é com os doutores Paulo e Roberto, que me pagam do próprio bolso. O Projeto só continua lá porque eles, reconhecendo a importância, me pagam para trabalhar.

Marcia – Mas, você vai fazer o que com essa meninada que já está adiantada?

Obdias - Aí é que vem a melhor parte, a parte do coração, este que é musical. Criei a Orquestra Zacarias Araújo. Estes meninos, a nata dos meninos de Santana e do Coração, nsaia todos os dias. Uns na minha casa, às 17h30, outros em Santana, na Promotoria e na Casa Brasil.
Marcia – A Orquestra já se apresentou publicamente?

Obdias – São jovens de 12 a 16 anos. A última grande apresentação foi no Natal da Procuradoria. Sempre estou nas igrejas, e se não saio mais é por falta de transporte. Tenho a arte, e os meninos demonstram ter o gênio.

Marcia – Qual é o repertório?

Obdias - My Way, Carinhoso, algumas dos Beatles, do Stevie Wonder. Depende do freguês e do que estivermos ensaiando. Também muito do que convencionaram chamar de gospel.

Marcia – Tem alguns que se destacam pelo talento?

Obdias - Com certeza! Infelizmente, quatro deles já não estão conosco.

Marcia – Por quê?

Obdias - Sabe como é... Chega a idade, vem o SENAC leva um, o SENAI outro. A Aeronáutica me levou um, e tem o Gerson, que foi ajudar o pai num açougue. Há um ano estava aqui comigo Darléne Leoté Bente, uma moça da Guiana Francesa, que mora no Coração. Excelente aluna. Destaque legal.

Marcia – Saem em busca de profissionalização, sobrevivência?

Obdias - Tento conciliar. Às vezes, consigo. É aí que eu precisaria ter do meu lado alguém pra me ajudar a tocar o projeto, o que viabilizaria meu trabalho. É assim: O projeto ensina crianças que passam a integrar a Orquestra. Funciona, Márcia! Nasci para este trabalho.

Marcia – Eu sei amigo. Nasceu mesmo.

Obdias – Márcia! Precisamos, eu e os meninos, deste apoio. Preciso de instrumentos. Preciso de um mantenedor. Acabo de receber o pagamento deste mês. É muito legal o carinho com que me tratam os doutores Paulo e Roberto. Já pensou! Quatro anos, todo mês eles me pagam de seus bolsos. Um relacionamento de pura amizade e reconhecimento pelo meu trabalho. Choro, ao pensar nisso, amiga...

Marcia – Já tentou aprovar o projeto pela Lei Rouanet?

Obdias – Márcia, vamos trabalhar juntos? Dou-lhe o Projeto, lhe passo tudo, e você me ajuda com a Lei Rouanet. Me põe sobre as pedras.

Márcia – Ajudo sim. Claro!

Obdias – Aliás, não quero sua ajuda, quero sua parceria.

Um comentário:

Alcilene Cavalcante disse...

Márcia, Márcia, esse projeto é muito lindo. As crianças e adolescentes já tocam pra caramba. Nessas horas é que eu queria ter dinheiro e ser mantenedora de um projeto desses cultural, artistíco, social.