15 de dez. de 2008

Lírica amazônica no Teatro da Paz nesta segunda

Em 1793, a ópera Ézio em Roma, com música de Niccoló Jommelli (1714-1774), era apresentada no “Theatro do Pará”, em Belém. O espetáculo musical foi documentado na peça teatral Drama recitado, de José Eugênio Aragão e Lima. Graças a um projeto de pesquisa sobre a trajetória operística na Amazônia, parte dessas apresentações históricas poderá ser apreciada novamente nesta segunda-feira (15/12), no Teatro da Paz, em Belém.

“O que vamos fazer é reproduzir uma versão hipotética do que teria sido aquela apresentação”, disse à Agência FAPESP o pesquisador Márcio Leonel Farias Reis Páscoa, professor do curso de música da Escola Superior de Artes e Turismo da Universidade do Estado do Amazonas (UEA), que dirige o projeto intitulado “Pesquisa e Restauração do Patrimônio Musical do Brasil Colonial: lírica na Amazônia e seu âmbito de diálogo cultural, durante o século 18”.

Diante de um tema considerado insólito para a região – a música erudita na região amazônica no período colonial –, Páscoa encontrou um objeto de pesquisa inédito e criou, na UEA, um grupo de pesquisa com participação de 23 bolsistas, envolvendo professores e alunos do curso de música. O objetivo era mapear as obras musicais executadas no século 18, digitalizar as partituras, restaurar o patrimônio sonoro esquecido e, finalmente, selecionar peças musicais para a reprodução.

As investigações levaram à comprovação de que houve apresentações líricas em Belém, no Pará, e em Cuiabá, no Mato Grosso, no século 18. O fato foi documentado na peça teatral de Aragão e Lima, que relata a apresentação não apenas de Ézio em Roma, mas de um outro espetáculo intitulado Zenobia, além de textos anônimos, com depoimentos extensos sobre esses eventos.

Ézio em Roma, segundo o autor da pesquisa, foi exibida em muitas cidades da Amazônia com participação dos chamados “artistas viajantes” e, principalmente, de artistas locais. “No século 18, os espetáculos teatrais musicais ocorriam principalmente por ocasião das festas, que envolviam solenidades do calendário religioso, recepção ou despedida de um governante, além de nascimentos de herdeiros. De modo geral, ocasiões que propiciavam festivais nos quais esses espetáculos eram realizados”, explicou Páscoa.

O texto original da ópera foi localizado na Fundação Calouste Gulbenkian, enquanto a música do compositor italiano Niccoló Jommelli foi encontrada na Biblioteca da Ajuda, ambos em Lisboa. A pesquisa possibilitou a reconstituição de Ézio em Roma, uma ópera de cordel – um gênero comum na época –, cujo texto em italiano foi trazido e adaptado para o mundo luso-brasileiro do século 18.

A reconstituição desse patrimônio sonoro se deu exclusivamente com artistas locais, com a Orquestra de Câmara da UEA, alunos e professores, entre eles os solistas, do curso de música da mesma instituição e da Universidade Federal do Pará (UFPA). “As pessoas não imaginam a riqueza musical brasileira daquela época. A intenção é que, ao final da pesquisa propriamente dita, possamos realizar apresentações das óperas selecionadas e estudadas, executando-as em instrumentos mais próximos possíveis ao que aqui se usou no século 18, a fim de preservar a mesma estética e técnica utilizadas", afirmou o pesquisador.

A pesquisa com fontes na Europa foi facilitada pela própria trajetória do pesquisador. Páscoa realizou seu doutorado em Ciências Musicais, na área de Letras, na Universidade de Coimbra. O professor foi recentemente homenageado pela instituição durante a comemoração dos 200 anos da vinda da Corte Portuguesa para o Brasil – evento realizado em 27 e 28 de novembro em Coimbra.

A apresentação de Ézio em Roma no Teatro da Paz ocorre a partir das 20h, com entrada franca. O evento contou com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Amazonas (Fapeam), da Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia do Amazonas (Sect), da UEA, da Fundação de Amparo à Pesquisa do Pará (Fapespa) e da Associação de Amigos do Teatro da Paz.

(Por Michelle Portela, de Manaus)

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